Outro dia abordarei com mais detalhes o meu apreço por outros tipos de planejamento, mas o de viagens é um que me é especialmente caro. Meu auge foi em 2013, quando planejei minha até então única viagem à Europa. Pouco depois, uma colega de trabalho viu como tinha dado certo meu planejamento e pediu que eu fizesse o mesmo para ela e o marido.
Na época eu tinha mais tempo livre do que hoje, então fiz com prazer. Parti do meu roteiro e cheguei à viagem deles, que adoraram e até me pagaram e ainda trouxeram chocolates. Então pensei em fazer desse hobby algo maior, que de repente até me rendesse uma verba extra. Mas não foi pra frente. O máximo que fiz foi montar um formulário para conhecer os viajantes e poder pesquisar com base em seus interesses.
A ideia dessa edição é dar algumas dicas de como eu faço quando quero planejar uma viagem. É o meu estilo, que dá certo para mim. Pra você pode não ser a melhor alternativa, mas de repente as dicas servem para alguém.
Por onde começar?
Os dois primeiros passos são definir quem vai viajar e para onde. E são dois passos que uma pessoa de fora não pode contribuir muito. Mas sempre é possível apontar alguns sinais que devem ser observados.
A companhia depende da vida de cada um. É comum que o desejo de viajar com alguém venha da relação que se tem com essa pessoa, seja uma relação romântica, familiar ou de amizade. Mas caso o interessado não tenha ninguém pré-selecionado, o ideal é observar quem pode combinar com você.
Na viagem que mencionei acima, eu não queria ir sozinho. Então eu listei as possibilidades de amigos a convidar e pensei em um que aguentaria o mesmo ritmo que eu (ou até mais intenso) e que não faria tantas objeções aos lugares que eu já tinha interesse em visitar. E foi maravilhoso. Eu planejei a viagem praticamente sozinho e ele foi concordando com tudo e a única coisa que pediu foi para visitar algumas lojas e comprar coisas.
Este não é um detalhe pequeno: se seu principal objetivo é ir a museus, chamar alguém que não curte pode ser ruim para os dois. Claro, quando queremos viajar com a pessoa com quem estamos nos relacionando, aí vai dos envolvidos chegarem a um meio termo que não desagrade demais a um nem ao outro.
E o lugar depende de basicamente três pontos: gosto pessoal, tempo e dinheiro. Não adianta escolher a Tailândia se você tem só quatro dias para viajar. Não compensa escolher Paris se seu orçamento mal cobre as passagens. E muito menos ir pra Punta Cana se você não gosta de praia.
Então vale dar uma lida sobre os lugares e ver se combinam com você, se cabem no seu tempo livre e se você pode pagar.
Fechando datas e locais
Dependendo da viagem, pode ser que inclua mais de uma cidade. No meu caso, eu sabia que queria ir à Europa. Mas não tinha selecionado cidades ainda. Comecei a fase de pesquisa com os deslocamentos. Meu desejo inicial era ver Londres, Paris, Roma e Atenas. Mas desisti dessa última porque era contramão. Eu queria fazer uma viagem meio corrida, perder um dia inteiro em trânsito não ia rolar. Depois surgiu Barcelona, porque meu tio e meu primo moram na cidade. Então coincidiu que uns amigos estariam em Munique bem no período e acabei encaixando. E já que ia a Munique, passei a régua acrescentando Berlim.
Mas essa é uma pesquisa cuidadosa, em sites de passagens aéreas ou até no Google Maps, checando os horários disponíveis. Dependendo do local, pode caber o aluguel de um carro, o uso de um trem, e a certeza dos meios de transporte pode até vir num próximo passo, mas é fundamental ter uma noção das possibilidades para ajudar a decidir se determinado local cabe ou não na agenda.
Agora estou pensando numa viagem a Minas Gerais, e já decidi cortar algumas cidades porque não encaixam bem no roteiro. Se eu for de Belo Horizonte para Ouro Preto, Mariana, Tiradentes e São João del Rey, ir a Diamantina fica muito complicado. É lá do outro lado de BH.
Com base nas cidades, no tempo livre e no orçamento, chega a hora das passagens. E aqui eu não sou o maior especialista. Só sei que comprar a menos de um mês costuma ser bem mais caro. Às vezes compensa monitorar promoções, usar navegador anônimo ou olhar em horários variados.
Já comprei as passagens e defini as cidades e agora?
Agora é descobrir quantos dias você vai ficar em cada uma. Isso requer uma análise do que cada local pode oferecer. E, ainda, que viagem será essa.
Algumas perguntas que podem ajudar:
Conhecer os pontos turísticos mais básicos ou também há interesse nos alternativos, como lugares mais frequentados pelos moradores locais que por turistas?
Qual o ritmo dos viajantes: mais leve, mais intenso, atlético?
Qual o nível de interesse por museus? E de que tipos?
E por teatro? Shows musicais?
Gosta de atividades ao ar livre? Esportes radicais?
Qual o nível de interesse por conhecer a gastronomia local?
E pontos turísticos mais históricos?
Deseja fazer compras na viagem?
Deseja ir a boates, barzinhos, aproveitar a noite?
Ao pesquisar cada cidade é essencial ir anotando os pontos que forem do interesse dos viajantes no local. E com base no tempo disponível, pode-se decidir quantos dias você vai ficar em cada lugar.
O equilíbrio não é fácil. E com a experiência as coisas vão melhorando e o planejamento vai se tornando melhor. Também é importante ressaltar que nesse momento os dias são uma previsão que ainda pode ser alterada.
Deslocamentos
Como trafegar de uma cidade a outra? Tem trem? Ônibus? Avião? Vai alugar um carro? Este ainda não é o momento de comprar os deslocamentos, mas de ver os horários, como fica bom pra cada situação, etc. É um progresso da pesquisa inicial sobre as cidades, um pouco mais definitivo.
Às vezes é bom usar um horário pouco comum para um voo, como, sei lá, às 23h. Continua dando pra passear nesse dia e no outro. Mas há alguns pontos a considerar nessa decisão: a noite será mal dormida, como isso vai impactar seu dia seguinte? Após sair do hotel na cidade de origem vai ter onde deixar a mala pra passear? Ao chegar no destino, vai ter transporte público de madrugada ou vai gastar com táxi ou Uber? Compensa trocar uma diária de hotel por um leito num trem noturno?
Conhecer o transporte público também é relevante para o seu planejamento. Se for a uma grande cidade da Europa, certamente vai usar metrô. Quanto custa? Tem algum cartão tipo bilhete único? Vai, sei lá, alugar uma bicicleta?
Montando o roteiro detalhado
Seu planejamento inicial está pronto e você deve ter uma lista de datas e deslocamentos mais ou menos assim:
20/03: chegada a Paris às 9h
24/03: ida de Paris a Londres durante a tarde
28/03: ida de Londres a Berlim durante a noite
E deve ter uma lista prévia de pontos turísticos de cada lugar. Então agora você vai encaixar as coisas. Essa parte é complicada. Eu sugiro usar um Google Maps e ir favoritando os pontos de interesse para checar a distância entre eles. Dá pra ir no Palácio de Versailles e na Eurodisney no mesmo dia? Talvez não. Dá pra ir na Basílica Sacre Coeur e no Moulin Rouge em sequência? Opa, talvez sim.
Nesse momento se começa a perceber que não deve caber tudo o que você gostaria. E escolhas devem ser feitas. Não visitar o Museu D’Orsay ou ir mas ficar apenas 3h nele e apenas 4h no Louvre pra encaixar os dois num único dia? Os horários de abertura compensam? Opa, dá pra deixar o Louvre pro dia de entrada gratuita?
Reserve sempre brechas de tempo. Não programe 9h-13h num lugar e 14h-18h em outro que fica a 30 minutos de distância. Que horas você vai comer? Vai estar sempre andando super rápido ou quer aproveitar também as ruas, viver a cidade?
Aliás, é essencial ter espaços em branco no seu roteiro. Uma tarde livre para se andar a esmo. Para ir a algum lugar que você só descobriu que existia ao chegar na cidade. Ou que o recepcionista do hotel sugeriu. Dependendo de quantos dias for ficar no local, dá para deixar um dia inteiro de backup.
Ao montar o roteiro detalhadamente, você pode decidir que é melhor cancelar uma cidade e aproveitar melhor as outras. Ou ficar um dia a mais aqui e um a menos ali. Ou até trocar a ordem, quando isso for viável, pois o lugar que você mais quer visitar na cidade só abre de sexta a domingo e você ficaria lá de terça a quinta.
Onde dormir
Com os dias fechados, é preciso reservar a hospedagem. Você gosta de acampar? Ficar em hostel? Pousadinha charmosa? Hotel chique?
Compensa pagar menos e ficar mais distante? Em Londres, por exemplo, dependendo da hospedagem muda a zona do metrô e você vai gastar mais nos deslocamentos. Tem estacionamento, caso você esteja alugando um carro? A hospedagem tem como ficar com sua mala se você quiser chegar muito cedo ou sair muito tarde? Como é a segurança da região pra chegar tarde da noite?
O café da manhã está incluso? Se não estiver, tem onde comer perto?
Eu sei, são muitos detalhes. Mas é assim mesmo. Eu levei meses para planejar a viagem de 24 dias pela Europa. Porque é um trabalho que, para ser bem feito, precisa de atenção e muito cuidado.
Comprando tudo
Antes de mais nada, compre ou reserve seus deslocamentos entre as cidades. Sim, inclusive os trens. É bem mais seguro já chegar com as passagens compradas, horário certo, etc.
Depois reserve as hospedagens.
Pronto, tudo bem encaminhado. Mas compensa antecipar os ingressos das atrações? Depende. Em casos como no Palácio de Versalhes ou no Museu do Vaticano, compensa demais. Você fura uma fila de horas se chegar com o ingresso em mãos. Claro que isso significa que você não terá como trocar o dia. Se acontecer um imprevisto, perde-se o ingresso. Mas a ideia de planejar em detalhes é evitar que isso aconteça, não é?
Tem outras ocasiões que pode valer a pena não comprar o ingresso antes. Por exemplo, se você quer ir a um musical do West End em Londres, mas não faz questão de qual, você pode deixar pra ver no dia quais as promoções e pagar bem menos do que comprando online.
Os últimos retoques
Se houver algum restaurante específico que seja imperdível pra você, ele deverá ter entrado nos pontos de interesse. Mas fora isso, pode-se agora pesquisar as opções conforme seu interesse gastronômico e a verba disponível. Veja listas no TripAdvisor, leia reviews no Google Maps e procure blogs ou perfis de Instagram locais recomendando opções de comida. Busque, principalmente, o que combina com o seu roteiro. Vai passar o dia no Louvre? Leve um lanche ou coma na lanchonete do museu. Tem três lugares conhecidos pelo melhor Currywurst de Berlim? Qual deles fica mais próximo de um roteiro seu?
Você pode salvar tudo local no seu celular para evitar riscos de ficar sem sinal 4G. Ou até mesmo imprimir os itens essenciais, como ingressos. Eu gosto de ir montando uma planilha para ter noção de horários e de quão cheios estão os dias. Algo assim:
E num arquivo textual vou definindo com mais detalhes. Às vezes compensa já bolar os itinerários de metrô. Ou então deixar esses detalhes pro dia do passeio mesmo.
Claro que tudo isso se aplica pra quem deseja planejar suas viagens. Se você gosta de viajar bem livre, ir descobrindo o roteiro na hora, não adianta tentar nada do que eu sugeri.
Mas e aí? Vocês planejam suas viagens? Gostam de mais liberdade? Alguém planeja pra vocês?
Um Filme: Close
Um dos meus subgêneros favoritos de filmes é o coming-of-age, que talvez possamos traduzir como histórias de amadurecimento. Quando esse amadurecimento envolve a descoberta dos sentimentos é ainda mais atrativo para mim. Close é um coming-of-age belga, do diretor Lukas Dhont, e que conta a história de como dois meninos de 13 anos vão se distanciando.
Não é um filme fácil, é um dos mais dolorosos que vi esse ano. A sensibilidade e o respeito com que o cineasta enxerga as crianças da história torna tudo mais intenso. Close desperta reflexões, principalmente acerca do impacto que temos nas vidas de outras pessoas.
Leia a minha opinião completa sobre o filme no Letterboxd: Close
Onde ver: nos cinemas
Outros filmes que vi recentemente:
The Quiet Girl (indisponível)
Living (indisponível)
007 Contra GoldenEye (Amazon Prime Video)
Belle (Netflix)
Um Livro: Os Robôs da Alvorada, de Isaac Asimov com tradução de Aline Storto Pereira
Não é segredo que eu me interesso muito por Ficção Científica e busco ler muitas obras do gênero, das clássicas às modernas, passando pelas relevantes mas menos conhecidas. Inevitavelmente eu precisaria ler algumas obras do Asimov, por ter sido tão influente durante algumas décadas. Eu li alguns contos, li a trilogia original de Fundação e agora terminei a trilogia original dos robôs.
O conceito por trás de Fundação é o mais genial, talvez seja a ideia mais brilhante do autor. Mas eu tenho dificuldades com livros em que personagens não importam muito. É muito difícil pra mim amar um livro de contos, por exemplo. Gostar muito, sim. Amar, é raro. Porque não dá tempo de desenvolver as coisas e já acaba. Contos dão só um gostinho. Eu curto ler calhamaços e trilogias mais do que contos, hahaha. E Fundação é meio que uma série de contos e noveletas. Algumas são ótimas, mas não consegui amar.
Assim, a trilogia dos robôs me interessou muito mais, até porque eu não tinha grandes expectativas. E usa robôs e Ficção Científica como background para histórias policiais, que eu também adoro. Nem Elijah Baley nem Daneel Olivaw são grandes personagens, mas eles são tridimensionais, e acompanhar as investigações foi um prazer. Pena que este terceiro seja o mais fraco dos três.
Leia a minha opinião completa no Goodreads: Os Robôs da Alvorada
Uma Série: The Last of Us
Eu não tenho sido muito a pessoa dos videogames nas últimas décadas. Não que eu não goste, longe disso. Mas não dá para fazer tudo e acabo despriorizando. Então eu conhecia The Last of Us de nome e já tinha ouvido comentários sobre a continuação. Mas eu não tinha muita noção do que me aguardava na série estrelada por Pedro Pascal e Bella Ramsay além de uma sinopse e uns poucos spoilers.
Embora a temática zumbis esteja um pouco saturada pro meu gosto, The Last of Us não tem quase relação com uma série como The Walking Dead. Embora ambas vendam a premissa de que os verdadeiros vilões são os humanos, TWD faz bem mais uso de jump scares e cenas de horror. E é também uma série de elenco, com vários personagens relevantes. TLOU é uma história pequena, sobre duas pessoas. Sobre confiança. Sobre trauma.
Joel e Ellie são personagens quebrados. Ele, praticamente sem salvação. Já ela é jovem, pode aprender a ser feliz. Mas é na relação de um com o outro que está a força da série criada por Craig Mazin e Neil Druckmann.
Também vale observar a diferença no ritmo. Quase cada episódio de TLOU seria uma temporada inteira de TWD, com um novo local, um novo vilão. TLOU assume a natureza de um road movie, onde os cenários são sempre passagem e nunca destino.
A série funciona graças aos roteiros bem elaborados, que não se furtam a gastar episódios inteiros contando uma história quase paralela à principal, mas que ajuda a construir o mundo da trama. E funciona também devido às atuações incríveis, especialmente de Ramsay, que tem o arco narrativo mais completo.
Onde ver: HBO Max
Um Podcast: The Community Library
Eu já falei algumas vezes desse podcast no meu antigo Medium, mas achei que caberia a recomendação na newsletter. O podcast é conduzido em inglês pela jovem atriz australiana Angourie Rice, que não tem grande expressão em Hollywood, mas faz uma ponta como Betty Brant nos filmes mais recentes do Homem-Aranha. Angourie é uma leitora voraz e decidiu criar o podcast como forma de discutir suas leituras e outros temas.
O podcast está parado há alguns meses, não sei se um dia vai voltar. Mas tem uma centena de episódios no feed. Nem todos são bons, mas recomendo especialmente as análises comparativas. Meu favorito até então é o 5.06 - Anatomy of a 90s Literary Teen Adaptation, onde a host comenta os filmes As Patricinhas de Beverly Hills, 10 Coisas que eu Odeio em Você e Ela é o Cara e como essas obras adaptam clássicos da Literatura para um público teen dos anos 90.
Eu havia ouvido só a quinta temporada, mas esse ano comecei do início e gostei do 1.18 - Straight Up Rebellion in A Room of One's Own with Maija, onde Angourie e sua convidada discutem Um Teto Todo Seu, ensaio feminista da Virginia Woolf. Minha impressão ouvindo este podcast é que o ensino de Literatura na Austrália é muito mais focado na reflexão e na crítica que em saber os principais pontos das obras pra passar no vestibular.
Se quiserem saber mais, este é o site do podcast: https://www.angourieslibrary.com/blog
Uma Newsletter: Te Escrevo Cartas, por Paula Maria
A Paula é sempre uma pessoa muito simpática e proativa no mundinho das newsletters brasileiras. A Te Escrevo Cartas é um espaço de reflexão e neste mês está focado nas mulheres, devido ao 8 de março. Nesta última edição, a Paula reflete sobre a relevância de ler pessoas como ela, mulheres, brasileiras, contemporâneas, com os mesmos tipos de problemas.
Confiram:
Te lendo só senti saudades de viajar e de planejar. Quem sabe ano que vem não role de fazer uma viagem dessas mais longa!
Putz! Esse crepe com sidra é bom demais!