Se você não leu as edições anteriores, clique e leia:
Cyberpunk
O Cyberpunk é definido pela mistura de baixa qualidade de vida e alta tecnologia. Trata-se de sociedades futuristas com alta ênfase à Internet, hackers e realidade virtual, mas com um aspecto distópico da vida ser péssima para as pessoas. Os protagonistas de tramas cyberpunks normalmente se encontram à margem dessa já distópica sociedade, tendo que usar de suas habilidades cibernéticas para sobreviver.
Neuromancer, de William Gibson, é a obra mais famosa do subgênero. Mas podemos falar também do filme Akira, de Katsuhiro Otomo, ou de Blade Runner, de Ridley Scott. Jogador Número Um, livro de Ernest Cline, é um exemplo mais recente.
Mas o interessante sobre Cyberpunk é que o conceito inspirou um sem número de derivados, que são o tema desta terceira parte da newsletter sobre os subgêneros da FC. Como ponto em comum, a maioria deles traz o aspecto rebelde ou revolucionário do punk.
Derivados Retrofuturistas
Os derivados mais famosos estão na seara retrofuturista. Basicamente trata-se de levar tecnologia para uma época passada e a desenvolver com base nos elementos tecnológicos de então.
O Steampunk é o derivado mais famoso, talvez porque seu visual tenha se tornado muito marcante e gerado todo um mercado de cosplays e até eventos próprios onde as pessoas se vestem no padrão. O Steampunk é ambientado no período do início da Revolução Industrial até antes da I Guerra. Máquinas a vapor, computadores mecânicos, tudo à base de prata, ferro, couro e madeira. O quadrinho A Liga Extraordinária, de Alan Moore; o livro Leviatã, de Scott Westerfeld; e a animação Laputa - Castelo no Céu, de Hayao Miyazaki, são exemplos de Steampunk.
Quando passa a I Guerra, entramos no período do Dieselpunk, que segue até por volta dos anos 50 e foca na tecnologia de combustíveis fósseis. Sky Captain e o Mundo de Amanhã é um filme representativo, mas outros anteriores ao termo também se encaixam, como alguns Indiana Jones ou Rocketeer. Acerca de livros, fala-se de O Homem do Castelo Alto, do Philip K. Dick, já citado quando falamos de História Alternativa.
Os períodos históricos que geraram subgêneros retrofuturistas são inúmeros: Atompunk (era nuclear), Stonepunk (era da pedra), Bronzepunk (antiguidade, gregos e romanos), Steelpunk (final do século XX) e Formicapunk (também conhecido como Cassete Futurismo, início dos anos 80) são outros exemplos.
Derivados Futuristas
Com temática similar ao Cyberpunk, o Biopunk troca as próteses ou olhos biônicos por tecnologias mais biológicas, como engenharia genética. Se o Cyberpunk muitas vezes coloca humano vs máquina, o Biopunk lida com humano vs pós-humano. O filme Gattaca trata muito diretamente de melhoramentos genéticos. Outro exemplo é o livro The Windup Girl, de Paolo Bacigalupi ou a série Orphan Black, que lida com clonagem.
Muito similar ao Biopunk é o Nanopunk, mas com o foco apenas em nanotecnologia. A série de jogos de videogame Crysis ou os filmes do Homem-Formiga lidam um pouco com a questão.
No meio desses derivados futuristas e parcialmente relacionado com a próxima categoria está o Pós-Cyberpunk, que seria uma evolução das premissas originais, com os protagonistas abandonando o individualismo e se tornando pró sociedade; as tecnologias saindo do controle das grandes corporações e se tornando mais positivas. Ou seja, é basicamente o Cyberpunk sem o aspecto distópico. O Cyberpunk surgiu nos anos 80 pensando no futuro, o Pós-Cyberpunk surgiu depois da integração da Internet no nosso cotidiano, então pode haver as corporações, mas também tem o lado positivo da tecnologia. O anime Ghost in the Shell costuma ser citado como um exemplo.
Derivados Otimistas
Nos últimos anos vem surgindo a necessidade de escrever obras mais otimistas e positivas, para balancear a catástrofe de autoritarismo e apocalipse climático que vêm nos assolando. Entre esses subgêneros, dois se confundem em alguns momentos, o Hopepunk e o Solarpunk.
A tradução dos nomes dão pistas. Hopepunk fala de esperança. A situação continua ruim, mas o viés da obra apresenta uma positividade, enxerga o copo como meio cheio. Hopepunk é sobre a resistência ao mundo distópico. É sobre gentileza e positividade. Os livros da Becky Chambers, como A Longa Viagem a um Pequeno Planeta Hostil e Salmo para um Robô Peregrino, são considerados bons exemplos; bem como o desenho Steven Universe. Então este subgênero é menos sobre o cenário e mais sobre a abordagem.
Já o Solarpunk trata especificamente do clima. Faz uma interseção com Cli-Fi (que será abordado na próxima e última parte dessa série), mas sempre com um olhar positivo. Solarpunk é quando nós vencemos as mudanças climáticas. Não quer dizer que não possa haver conflito ou que seja sempre um cenário utópico, o Solarpunk abrange desde a luta até a vitória. Em algum momento no meio pode ter interseção com Hopepunk, com Cli-Fi e com Utopia, mas o foco sempre é a sustentabilidade ecológica. O Solarpunk também é um forte movimento estético, com prédios verdes, veículos solares, etc. E é algo que quero abordar melhor aqui um dia. Os livros do Kim Stanley Robinson são sempre citados como exemplos, como a Trilogia de Marte; e a antologia Como aprendi a amar o futuro: Contos solarpunk, que inclui vários autores brasileiros.
Você tem algum derivado do punk favorito? Eu sou particularmente interessado em Solarpunk, porque é o que precisamos agora: abordar as mudanças climáticas, mas trazendo soluções e construindo a esperança de que possamos chegar lá.
Um Filme: Contos de Roald Dahl por Wes Anderson
A estética pastel e estilizada de Anderson já havia se encaixado muito bem com a obra do escritor Roald Dahl, na adaptação de O Fantástico Sr. Raposo, que é um de seus melhores trabalhos. Mas agora o diretor se propõe a adaptar quatro contos de Dahl, na forma de curtas lançados diretamente na Netflix.
A meta-camada dos curtas é genial, com Ralph Fiennes interpretando o próprio Dahl, que às vezes aparece para fazer comentários sobre a história; e, mais além, com alguns detalhes dos cenários e da maquiagem assumindo um aspecto mais teatral, de mudanças e artificialidade na frente das câmeras em vez de atrás delas. E essa decisão se encaixa muito bem no estilo de Anderson, parecendo apenas um passo além do que ele já costuma fazer.
O melhor dos curtas é A Maravilhosa História de Henry Sugar, que é mais longo e pode se desenvolver a contento. Ben Kingsley e Benedict Cumberbatch estão incríveis e o roteiro se desenrolando como uma boneca russa também. O Cisne é o mais triste e contido. Já O Caçador de Ratos foi o que menos curti, mas ainda é um bom exercício de estética. E, por fim, Veneno é o menos inovador no aspecto visual, mas compensa com uma narrativa instigante.
Leia a minha opinião completa sobre os filmes no Letterboxd: A Maravilhosa História de Henry Sugar, O Cisne, O Caçador de Ratos e Veneno
Onde ver: Netflix
Outros filmes que vi recentemente:
A Princesa Prometida (Amazon Prime Video)
Perfect Blue (Indisponível)
Asteroid City (Indisponível)
Um Livro: As Brigadas Fantasma, de John Scalzi com tradução de Petê Rissatti
Como interessado por Ficção Científica, eu gosto de tentar conhecer obras dos mais variados autores. Assim, li A Guerra do Velho, do John Scalzi. Apesar de ser Sci-Fi Militar, parte de uma premissa criativa e desenvolve bem seu protagonista. Assim, decidi ler o segundo volume da série, As Brigadas Fantasma. Continua divertido, com algumas cenas empolgantes, mas empalidece perto do primeiro. O principal motivo é que o foco está em outro personagem e este não é dos mais cativantes. Mas as ideias são boas e a expansão do worldbuilding é coerente. Foi uma leitura agradável, mas devo demorar a encarar o próximo.
Leia a minha opinião completa no Goodreads: As Brigadas Fantasma
Uma Série: Silo, primeira temporada
Em algum futuro não especificado, as pessoas vivem dentro de uma espécie de silo, uma estrutura subterrânea de 200 andares, com um sistema de separação social disfarçado e controles extremamente rigorosos acerca do que as pessoas sabem, de suas profissões, se poderão ter filhos, etc.
Eu não li a trilogia de livros que inspiraram a série, mas amei a adaptação. Além da Rebecca Ferguson ser uma das atrizes mais interessantes da atualidade, o apuro estético da produção é incrível. Claro, falo principalmente dos cenários. O cuidado com a caracterização do silo, dos apartamentos, dos locais de trabalho, que adotam uma estética retrofuturista. Inclusive talvez se encaixe em um dos punks do Sci-Fi.
O roteiro talvez funcionasse melhor com uns dois episódios a menos, Não chega a ter uma barriga, mas há momentos em que o ritmo poderia ser melhor. Mas eu gostei do cuidado com os detalhes e com a construção gradativa da trama. E o final dessa primeira temporada é chocante!
Onde ver: Appletv+
Outras séries que vi recentemente:
Ahsoka (Disney+): funciona melhor para quem viu a animação Rebels, o que não é o meu caso. Mas tem momentos bem interessantes e atuações carismáticas. Não gosto muito de como termina, mas especialmente o meio é ótimo. O ponto alto são as lutas de sabre de luz.
Demolidor, terceira temporada (Disney+): eu sei que estou bem atrasado, mas ainda quero terminar essas séries da Marvel feitas para a Netflix. Não esperava que a terceira temporada de Demolidor fosse tão bacana. O final é meio apressado, vale mencionar. Mas gosto do arco dos personagens e só a cena da prisão no quarto episódio já vale a experiência.
Um Podcast: Sábado Sem Legenda
Meus amigos Camila Fernandes, Diego Quaglia e Vincent Sesering produzem desde 2022 este podcast de cinema, que privilegia clássicos do Supercine e sessões similares. Os três são grandes cinéfilos e ainda recebem convidados gabaritados para discutir um filme a cada episódio. No momento da publicação dessa edição está rolando um especial de Halloween, com episódios já lançados sobre Da Magia à Sedução e O Exorcista. Ouçam a discussão sobre o clássico de William Friedkin aqui ou no seu agregador preferido:
Uma Newsletter: Linguagem Guilhotina, por Cristhiano Aguiar
O escritor Cristhiano Aguiar mantém essa newsletter onde aborda às vezes seu processo criativo, às vezes temas mais abrangentes da Literatura ou sua participação em eventos. Nesta última edição ele faz uma interessante análise da relação do brasileiro com contos: